quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Palavra



Palavra leite;

Palavra mel.

Nutre, calcifica, adoça;

Quero-te;

Amo-te;

Venero-te;

Vem, satélite natural de mim;

Raio de outono;

Rodopio de folhas, dentro dos tornados.

Atira,

Rompe,

Sacode;

Entorta;

Vem me cantar;

Encher de fitas meus cabelos;

Dizer onde, arrebatar;

Encara, faz brilhar.

Depois, me cobre, encombre, imanta;

Ó divina, vem me ninar.

Põe-me no colo, em um altar;

Cala, palavra.

Remove véus;

Move as páginas da bíblia.

E aí volta...

Nasce em mim, entranha;

Anoitece neste corpo; 

Toma, pelas mãos, dos dedos, que sonham tocar-te.

Sou teu instrumento.

De leve, bem leve. 

E, depois, forte, quase a morte;

Cega, engole,

Amolece meus ossos,

E, em seus de-leites,

Faz decolar!

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Carne e Pó


Sinto a dor da navalha que se arrasta na pedra;

Sou o que se desprende no atrito. 

Despenco no chão, pra sumir no tempo, e existir no lugar dos que foram banidos.

Também sou presunto, 

Minúsculos pedaços, talhados no viço da lâmina.

Meio pó, meio carne, corro na direção das fronteiras, para desaparecer onde as coisas se separam;

Onde o horizonte confunde o próprio rumo.

Visito pântanos;

Desabafo com as incertezas;

Peço conselhos aos arrependimentos;

Deixo eles me baterem.

Um voo, de descida acelerada.

Sou viva carne esfolada,

No caráter das implacáveis resiliências,

Que, deformadas, ressurgem dos mangues. 

E, dos sedimentos, construo berçários,

Entre a terra e o mar.

Dividida entre o firme e o que flui;

Achada no inimaginável processo de ser;

De querer ser melhor.


Receita de Mulher?

Quando chegar, terá que ser algo de belo, de fresco, leve,
Macio, firme.
A comida do cheiro, na brisa do vento.
Terá que não incomodar, não provocar náuseas, na presença, nem na ausência.
Terá que ser profundo e simples, côncavo, um abraço.
Terei eu que fazer o que, então?
Não, não terei que fazer nada!
Há tempo em que não há o que fazer;
Mas se todos dizem que assim, que acolá, que não me mostre logo, que seja mistério, algo sério?
Se dizem e ensinam receitas do que seja, de quem eu seja, do que diga ou cale, do que queira ou fale?
Do que cabe, do que é exagerado de grande ser?
E se a pressa dos apaixonados me pegar?
Se eu quiser acelerar? E me apresentar e sorrir e pular corda?
Terei eu que ficar muda, quando o meu amor chegar?
E, se assim funcionar, pra quem funcionará?