terça-feira, 12 de julho de 2011

Nave




Esse abalo que me desconcentra;
É o apagar de luzes;
Pavor aceso;
Experimento a sensação do laço;
A vertigem da rede.
Queria me desenroscar.
Deitar, no cais, com o rosto pras nuvens;
Manifestar, em versos, a inquietude que perturba as superfícies.
Trago no pulso a potência das touradas;
Nos dedos, uma valsa;
No peito, o anúncio da revoada, pronta pra liberdade.
Esse aviso enche o céu de estrelas;
Rouba a inspiração dos olhos;
Toda a graça das ideias.
Com a visão ainda turva desse éden concentrado,
Sinto a cobiça do encontro entre a Física e o desejo.
A memória quase lúcida dessa condição me esquece.
Sou o peixe no vôo;
O mergulho da ave;
Os ouvidos, na hora da largada;
Pensamento presente,
Cara boba, vivendo no além;

Força abduzida.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Acima

Não quero prosa, nem poesia.

Prefiro a gravidez do verbo;

Parto normal;

A centelha do primeiro sopro.

Na nudez da frase, quero febre;

E um frio, no ponto final.

Corpo presente,

Olhos vidrados,

Alma bailando.

A explosão de um suspiro, no meio da fala;

Costurar meu peito no teu;

E formar constelação.

Se teus ouvidos calarem meu pranto;

Se tua mente materializar meu riso;

Se tua pele sentir esse corte;

Se essa luz te fizer brilhar;

Então, hei de não querer nada mais.

Nem métrica, nem rótulo,

Nem verso, nem rima;

Porque aí, meu bem,

Estaremos bem, bem acima.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Carteiro



Só tive que falar de Pablo,

Seguir o teu chamado.

Sim, a poesia é nossa morada, testemunha;

Somos, juntos, o entusiasmo das sementes, solo afora;

Tudo o que existe para a possibilidade.

Consigo, com a força que me toma,

Quase sentir seu toque.

O efeito que me causas arde, no abafar do grito.

Estado de imobilização.

Tremor que cala, suspenso no ar;

Implorar de poros, que te querem tato;

Toda a fome contida na língua.

No sussurro das rosas,

Presas na minha garganta,

Vou longe pra te abraçar.

Espando-me, perco-me, transporto-me.

Reapareço no vermelho do vinho,

Pra te percorrer,

Afrouxar teu riso,

Banhar tecidos,

Inundar as fibras;

Afagar, sutil, os mais esquecidos atalhos.

E ver erguer a glória desse desassossego;

Fazer o álcool inflamar;

Esgotar a água até que tudo vire poça;

Compartilhar fragilidade;

Para só, então, declamar.

terça-feira, 17 de maio de 2011

24horas

O que há de inteiro;
Intenção,
Insuperável entrega mental.
Os olhos não cessam, não cerram.
Peregrinos das maçãs.
Tens o poder de adivinhar o original;
Saber rumos;
Antecipar pecados.
O dom de me guiar, sem dar comandos;
Trazer clarividência;
De onde aguardo a poesia chegar.
Fertiliza desertos;
Faz surgir água do fogo;
Do frio, sensações atraem.
É teu o mundo que nasce pela fé;
O que expande.
Todos os pontos fora.
É tanto que nem sei;
Que não seja contigo.
Só por hoje.

Tudo o que é demais entope. 



quinta-feira, 31 de março de 2011

Presença

Não há outra saída;

A não ser dar-te tudo o que, em mim, escorre prece;

Os mais certos pedidos;

A mais limpa intenção;

Nasceste em meu mundo, no tempo em que ser mulher era só ensaio.

Agora, das letras que me escrevem,

São tuas as palavras;

Tijolos da torre.

Sobe.

E, devagar, deixa que te tragam;

Até aqui, acima do céu, via láctea, espetáculo;

Porque na escuridão do espaço, eu te vejo.

Dançarei, na areia, sob a lua, em nome disso.

Vou olhar pra cima e declarar que o desejo repousa, no fundo das conchas, eterno.

Habita a distância entre as montanhas;

Mora na sorte das estrelas cadentes.

O quanto te quero está na emoção, atrás das coxias, segundos antes da entrada;

Na pausa para a puxada das cortinas;

No céu, rasgado em fogos, em noite de ano novo.

E estarei contigo em tudo o que de belo teus olhos tocarem;

Na arte natural dos mais felizes encontros;

Porque é no extraordinário que nos revelamos.

Onde o sagrado põe-se a orar.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Metáforas

O tempo, dizem os sábios, só existe na compreensão humana.

Hoje, quero nada de compreensão e tudo de humano.

Quero só este instante;

É o que há, de fato.

Viver, sem fim, as horas,

Em que, solitariamente, estou contigo.

Sentir, paralisada, o umedecer da planta;

Matar tua sede com sereno;

Levar-te à boca o orvalho desse frio que queima.

Quero ver subir brasa da terra,

Em dia de madrugada de sol;

Quando o peito se agitar em erupção,

Quero te soletrar os ciclones dos meus abalos;

Desprender em redemoinhos as mãos;

Pousar, no teu colo, toda essa ventania;

Postergar a chuva e, ligeira, apertar o passo,

E apertar o passo, apertar, apertar;

Até que todo o céu escureça e desabe;

Inaugurar o teu batismo.

Ser seu rito de passagem.

Estrear teu grito.

E sentada, te ver nascer.


quarta-feira, 16 de março de 2011

Fonte


Gosto de passar perfume à noite,

Depois, perco o cheiro no ar;

Perco.

Adoro ver a chuva escorrer pela janela;

Ganho.

Tô sempre com sede, 

Quase nunca, bebo água; reservo;

Meu pior defeito: a sede;

Meu melhor efeito: o último gole.

Exposição absurda desse ciclo motor.

Que seca e alaga.

Busca incessante, 

Ergue meu lado Golias,

Gosto de vê-lo crescer, crer;

Gosto de vê-lo cair;

Porque ele levanta David!

Fonte do meu exorcizar,

Faz catarata face, doce e sal;

A queda apronta meu ânimo;

Cresço.

Aí, fico surda de tanto pensar;

Minha cabeça é só barulho;

Tem sempre alguém, aqui dentro, de botas ou de salto, pulando;

Tem sempre um cheiro, um sinal, uma história, uma idéia, uma, um;

Tem sempre movimento;

Plenitude? Desconheço;

Não sei ficar parada,

Só sei morrer, de olhos abertos;

É essa sede que não acaba nunca...

Sou feita do “não cessar”;

Do incessante hábito da insatisfação, talvez;

Que brota no sertão das fantasias.

E germina em caravanas verdades.

Sou da espécie que sobrevive “apesar”;

Dos leões e das abelhas,

Dos lobos e dos gatos;

Sou carioca da gota, o lençol, de antes dos meus pés.

Abaixo das ranhuras da terra, que acumula, expande,

Vence em cachoeira.

É...seco, na superfície, pra despencar, por dentro;

Sem ninguém ver.

Caio, em Tejo;

Corro, em Thames;

Sonho, em Sena;

Viajo, em Nilo;

E, quando a seca me carrega em nuvens,

Sou toda entrega, de novo.

Toda, toda.

Para uma nova jornada. 

De altos, baixos e abaixos.

terça-feira, 15 de março de 2011

Quântico

O melhor quadro que já pintei!

Pedrinhas nos vidros...

Um suspiro, mão na garganta, suspendo da cama, corto o ar...

Na ausência de ruídos, vejo você;

Uma serenata, com teus lábios bailando palavras sem som.

Sim, da falta fazemos abundância.

Lembrei de como acontecem milagres.

Não preciso de mapas.

Você sempre esteve aqui,

Ali, embaixo, sem saber;

Parado, achando graça, 

Balançando a cabeça, fazendo do “não” pro que há de sim.

Você sempre subiu,

Atravessou pelas paredes;

Você, que me lembra Pessoa e Lídia, à beira do rio,

Toma a minha mão;

Converte a minha fé!

Viu minhas vertigens,

Acariciou incertezas;

Você, pra quem escrevo de madrugada,

Quando as horas preguiçosas controlam meus dedos hipinotizados pela ideia da sua possibilidade.

É de você que lembro, quando quero brotar.

Está nas gravuras, impressas nos olhos que nunca viram;

No frevo das cores;

No que só a sépia é capaz de capturar;

E eu, encarnada, esqueci.

Está na virgindade do branco,

Grávida de potencial.

Em tudo o que pulsa, pro aplauso do estouro.

Você que não é osso, não é limite, não cabe no espaço;

Vence o tempo e me derruba.

Aquele que é.

Idéia, tato, conexão, está em todas as plataformas de chegada,

Em tudo o que é bom.